Café: rally nas bolsas, clima adverso e tarifaço — como isso bate no bolso do produtor
Por Américo Ferreira – Safra Play
Agosto foi daqueles meses “sem café fraco”: o arábica disparou nas bolsas internacionais e o robusta acompanhou o bonde. O gatilho? Clima irregular no Brasil, estoques certificados apertados e a tarifa de 50% dos EUA bagunçando fluxos comerciais. Resultado: custo de reposição lá em cima e risco de esticar preços no varejo. Para o campo, é hora de estratégia fina: travar margem, ajustar calendário de venda e usar crédito certo. (Reuters, MarketWatch)
Rally nas bolsas: o que puxou a alta
- Arábica (NY): as cotações saltaram ~30% no mês, com contratos de referência se aproximando de US$ 3,85/lb no pico de agosto, refletindo clima e tarifa dos EUA. (MarketWatch, Reuters)
- Robusta (Londres): também voou ao longo de agosto; leituras de mercado apontaram alta na casa de 40% em alguns vencimentos, impulsionada por aperto de oferta. (Tridge)
- Estoque curto: os estoques certificados na ICE recuaram para patamares de ~15 meses de mínima no arábica e em declínio no robusta — isso dá combustível ao rali. (Comunicaffe International)
Clima no Brasil: recorde de 2026 ficou mais longe
Geadas pontuais, granizo e chuvas irregulares em áreas-chave de SP e Minas geraram estresse fisiológico que deve pesar na florada e no potencial produtivo, afastando a chance de “safra recorde” em 2026, segundo o Escritório Carvalhaes. (CaféPoint)
Tarifa dos EUA: impacto já no presente (e como pode mudar)
Desde 6 de agosto, os EUA aplicam tarifa de 50% a uma cesta de produtos brasileiros, incluindo café, tornando inviáveis muitos embarques diretos e empurrando preços para cima no mundo. Brasília abriu processo pela Lei de Reciprocidade, mas Lula não tem pressa para retaliar, preferindo negociar; o governo soltou um pacote de US$ 5,5 bi em crédito e compras públicas para mitigar efeitos em setores afetados. (Reuters)
O Cecafé alertou que acionar a reciprocidade agora é prematuro, pois pode dificultar a agenda técnica com compradores norte-americanos na tentativa de ampliar isenções. (cecafe.com.br)
Há também discussão em Washington sobre isentar itens não cultivados nos EUA, como café e cacau, em eventuais acordos — ponto para monitorar. (Reuters)
Fundamentos: estoques globais curtos e demanda resiliente
Especialistas lembram que, após safras deficitárias, reconstituir estoques globais deve exigir duas boas colheitas — alívio não vem de um dia para o outro. Ou seja, o mercado seguirá sensível a clima e logística. (Reuters)
O que fazer já: 7 movimentos práticos para produtor e pecuarista
- Proteja margem (hedge): avalie termos/opções no café e dólar. Preço bom no screen sem proteção vira ilusão quando o câmbio te pega.
- Trave insumos por etapas: compras escalonadas (fertilizantes/defensivos) reduzem risco de pegar topo de preço; negocie prazos com fornecedor.
- Calendário de venda: alinhe com cooperativa e trading janelas de embarque; fuja do gargalo logístico e negocie prêmio por qualidade.
- Qualidade que paga conta: invista em pós-colheita, seca e armazenagem para capturar diferenciais (especialmente no arábica).
- Diversifique destino: com os EUA “caros”, direcione lotes para China, Oriente Médio e México enquanto busca eventuais isenções. (Reuters)
- Seguro e contrato bem escritos: revise cláusulas de força maior e variação de frete/seguro; turbulência geopolítica pede papel que te proteja.
- Crédito certo, hora certa: acesse linhas do Funcafé (2025/26) para capital de giro, estocagem e comercialização — R$ 7,187 bi disponíveis, inclusive com apoio a regiões afetadas por geadas. (Agro Estadão)
E o varejo? Sinal de repasse à vista
A indústria alerta que a disparada do grão em agosto pode reverter a queda de preços ao consumidor observada no mês, pressionando o varejo nas próximas leituras. Para quem vende no mercado interno (torrefadores regionais), vale casar compra/venda com mais rigor para não carregar estoque caro. (Reuters)
Conclusão — sem rodeio
O quadro é pró-preço: clima irregular, estoques enxutos e tarifa dos EUA apertam a curva. A boa notícia é que quem age com método — proteção de preço, qualidade e crédito — mantém a fazenda no azul. O agro não espera: antecipa.